Saiba
reconhecer talentos
Por Patrícia
Bispo para o RH.com.br
Patrícia Bispo
Formada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo, pela Universidade
Católica de Pernambuco/Unicap. Atuou durante dez anos em Assessoria Política,
especificamente na Câmara Municipal do Recife e na Assembléia Legislativa do
Estado de Pernambuco. Atualmente, trabalha na Atodigital.com, sendo jornalista
responsável pelos sites:
www.rh.com.br, www.portodegalinhas.com.br e
www.guiatamandare.com.br.
A busca por
profissionais de talento tem sido uma constante na rotina das organizações,
afinal no mundo corporativo já existe a consciência de que o diferencial do
negócio está no potencial humano. Mas, como é possível identificar um
profissional de talento? O que o faz permanecer no quadro de uma organização e
ter comprometimento com o negócio? Muitos profissionais de RH deparam-se com
essas dúvidas e as respostas nem sempre são complicadas como muitos imaginam.
Para responder a
essas e outras questões, o RH.com.br entrevistou Eduardo Carmello, consultor
organizacional que tem dedicado-se à retenção de talentos corporativos.
"Denominamos talentos todos os profissionais, independente de sua posição
na escala hierárquica, que trazem uma grande contribuição para a organização.
Talentos não são somente um grupo de elite que está no topo da pirâmide",
afirma Carmello ao ser questionado se os talentos corporativos encontram-se
apenas em cargos de destaque. Confira a entrevista e descubra os talentos de
sua empresa!
RH.com.br - Qual o conceito de talento?
Eduardo Carmello - Talento vem do
grego talentus que é uma antiga moeda grega. No dicionário Aurélio, talento
significa "aptidão natural, ou habilidade adquirida; inteligência
excepcional". Para Buckingham & Coffman, talento é "um padrão
recorrente de pensamento, sentimento ou comportamento que pode ser aplicado de
maneira produtiva". O conceito de talento que utilizamos para a Gestão
Estratégica de Pessoas é todo profissional e capaz de contribuir
significativamente para a organização, manifestando suas competências para
produzir resultados extraordinários para a empresa, os clientes e para si
mesmo. Consideramos talentos todos os profissionais que estejam alinhados e
comprometidos com a produção de valor para o cliente.
RH.com.br - Qual a característica de um profissional de talento?
Eduardo Carmello - Os talentos
manifestam algumas características em comum. Dentre essas, podemos ressaltar
que eles gostam de desafios, conseguem gerenciar altos níveis de complexidade,
são sempre lembrados e indicados para novos projetos e desafios, necessitam de
feedback constante sobre o seu desempenho, precisam ver significado no que
estão fazendo. As pessoas de talento também necessitam de espaço para atuar e
inovar, estão aprendendo constantemente, assumem grande parte da
responsabilidade de sua própria gestão, desempenho e desenvolvimento.
RH.com.br - O talento humano pode ser
"classificado"?
Eduardo Carmello - Subir Choudhury,
em seu livro "A Era do Talento", pesquisou sobre a contribuição
eficaz dos talentos de várias organizações e criou o conceito "XYZ".
Onde:
"X" - Representa de 5% a 10% da força de trabalho, produz 60% a 70%
do valor intelectual ou conhecimento;
"Y" - Representa 25% a 30% da força de trabalho, produz 25% a 30% do
valor intelectual ou conhecimento;
"Z" - Representa 60% a 70% da força de trabalho, produz 5% a 10% do
valor intelectual ou conhecimento.
A análise "XYZ", demonstra a importância que deve ser dada ao
diferenciar as três classes, no que se refere à construção do conhecimento e
das competências, à gestão do engajamento dos talentos e, principalmente, a
gestão de seu desempenho. Cada classe, "X", "Y" e
"Z", deve ter um tipo específico de gerenciamento, pois contribuem de
forma diferenciada com os resultados alcançados. Vale ressaltar que é
importante não distanciar economicamente as classes, pois pode causar
preconceitos, competição, posse de conhecimento e desmotivação. Deve-se
promover um aumento médio do desempenho, diminuindo a variabilidade de
competências entre as mesmas, provocando um aumento da criação de valor.
RH.com.br - É tendência natural de um talento migrar de uma classificação para
outra?
Eduardo Carmello - A tendência é
natural quando o talento concebe e manifesta suas competências focadas na
construção de valor para o cliente. Costuma-se dizer que empregados pensam em
seus empregos e talentos pensam em seus clientes e consumidores. Em nossos
estudos em gestão de talentos percebemos que a ascensão rápida de um talento
provém da sua capacidade de entender as necessidades dos clientes, do alto
nível de resiliência - capacidade de manter inteligência, competência e saúde
em momentos de complexidade, pressão e mudança - e de manifestar seus conhecimentos
em ação contribuindo de maneira relevante para o ao alcance dos objetivos
estratégicos da organização. Os talentos que conseguem administrar essas
capacidades acabam naturalmente ganhando destaque e respeito.
RH.com.br - Para as empresas, qual a importância
de valorizar os talentos humanos?
Eduardo Carmello - Há uma questão
estratégica, cada vez mais compreendida nos dias atuais: gestão eficiente é
saber como inovar, criar sucesso sustentável. Os estudos de Robert Kaplan, Dave
Ulrick, C.K. Prahalad e outros profissionais de gestão demonstram que 80% da
geração de valor provêm dos ativos intangíveis - capital humano, intelectual,
marcas, patentes, relacionamentos. Valorizar talentos é gerir de maneira
responsável e segura a matéria-prima responsável pelo sucesso sustentável de
uma empresa, que é o conhecimento em si. O profissional do conhecimento é o
responsável pela criação de valor, pois trabalha ativa e proativamente com sua
inteligência para a condução e a conquista dos objetivos estratégicos da empresa.
RH.com.br - Que indicadores devem ser
considerados ao avaliarmos se uma organização está gerindo os talentos da forma
correta?
Eduardo Carmello - Teoricamente
falando, precisamos saber se a empresa possui um sistema de gestão que vincule
o capital humano aos objetivos estratégicos da empresa e que consiga mensurar o
impacto social e financeiro de seus talentos. Os sistemas de gestão que agregam
a questão do capital humano são os conhecidos Balanced ScoreCard (BSC)" ou
Gestão por Competências. Na prática, você precisa garantir que o sistema
construa valor.
RH - E como sabemos, na prática se o
sistema utilizado constrói valor?
Eduardo Carmello - Verificamos isso através
de três eixos:
*
alinhamento/orientação: o sistema precisa garantir que os talentos conheçam a
seguinte cadeia de valor: os fatores críticos de sucesso da empresa, os
valores, a intenção estratégica, as competências da organização, seus objetivos
estratégicos da empresa, assim como os indicadores, as metas, os projetos e as
competências que estarão sob a responsabilidade do talento;
* comprometimento/incentivo: o sistema precisa conseguir preencher as
necessidades coerentes dos talentos. Que mantenham entusiasmo, disponibilidade
e interesse pelo alcance dos objetivos e resultados da organização;
*
avaliação/capacitação: o sistema precisa traduzir competência em desempenho e
avaliá-lo. Mensurar os resultados do capital humano é um dos grandes desafios
do RH. Ter um sistema de mensuração ajuda imensamente na capacitação e na
construção dos conhecimentos adequados e necessários, para que os talentos
produzam os resultados esperados.
Dessa forma os
talentos são favoráveis à avaliação, pois percebem que o sistema não está
implantado para lhes dar uma nota, mas para ajudá-los a seguir na estrada certa
e descobrir quais os ajustes e os incrementos necessários de suas competências
para alcançar suas metas e objetivos.
RH.com.br - A valorização dos talentos é de
responsabilidade única da organização ou o líder também tem participação
fundamental nesse processo?
Eduardo Carmello - Considero uma
tripla responsabilidade. Da empresa, do líder e do próprio talento. Os estudos
de gestão da Entheusiasmos Consultoria com seus clientes que possuem modelos de
Gestão de Pessoas demonstram que, infelizmente, são poucas as empresas - não
mais do que 10% - que possuem um sistema ativo de Gestão de Pessoas. A empresa
precisa garantir a estrutura do sistema de Gestão de Pessoas. E o fazer
acontecer está na mão do líder, do RH e do próprio talento. Sabemos que muitas
empresas perdem talentos porque seus líderes não dispunham de um relacionamento
de valorização. Por outro lado, sabemos que muitos talentos não florescem,
porque não constroem para si um sistema próprio de desenvolvimento. Acreditam
que a sua organização e seu líder deveriam fazer isso. Isso é um resquício
assistencialista de gestão bem comum nas décadas de 80 e 90, que não serve mais
para os dias atuais. Portanto, consideramos que a valorização dos talentos uma
tríplice responsabilidade.
RH.com.br - Os talentos encontram-se apenas no topo da pirâmide corporativa?
Eduardo Carmello - Não, isso é um
equívoco do pensamento iluminista na organização. Denominamos talentos todos os
profissionais, independente de sua posição na escala hierárquica, que trazem
uma grande contribuição para a organização. Talento não é somente um grupo de
elite que está no topo da pirâmide. A experiência demonstra que os talentos
encontram-se em todos os níveis da organização, principalmente em posições
estratégicas - não se resume a cargo, mas com capacidade de geração de valor
para o cliente. Um caixa, uma frentista, um operário podem ser considerados
talentos. Pessoas que garantam o fluxo da geração de valor, do sistema central
ao capilar. Já vi empresa perder milhões por não valorizar e demitir um vendedor,
que foi logo contratado pela concorrente e conquistou eticamente os clientes da
antiga empregadora para si. Os clientes não estavam com a empresa e sim com o
talentoso vendedor. Infelizmente, a empresa só notou isso, depois de perder o
talento. Um diretor de uma multinacional, que faz coaching comigo, deixou de
transferir a conta de milhares de funcionários para um outro banco, pois ele
foi pessoalmente verificar o atendimento do gerente e seus funcionários e
concluiu que o serviço não estava à altura de seus funcionários. Você precisa
ter talentos em todas as posições altamente relevantes para a estratégia.
RH.com.br - Normalmente, que estratégias as
empresas utilizam para gerenciar seus talentos?
Eduardo Carmello - Denominamos
gestão estratégica de talentos o sistema gerencial que orienta, incentiva e
capacita o comportamento humano da organização, assim como cria o alinhamento,
o engajamento e a avaliação deste complexo sistema humano ao sistema
estratégico da organização. Sua principal missão está na habilidade de
implementar a estratégia da empresa e na capacidade de alinhar, formar e
entregar as competências humanas que garantam o bom desempenho organizacional,
criando o seu sucesso sustentável. Se o driver de uma empresa está posicionado
para serviços, precisará ter como competência essencial "orientação para
serviços". Tal empresa precisa de pessoas com essa competência e elas
conseguirão entregá-las, se o sistema de gestão estratégica de talentos e a
cultura organizacional prepará-las e motivá-las para tal.
RH.com.br - Além das técnicas, quais as competências comportamentais que as
empresas mais buscam nos talentos?
Eduardo Carmello - Isso irá depender muito das competências essenciais que
as empresas destacam para cumprir seu driver estratégico. Excelência operacional,
inovação em produtos ou orientação a serviços demanda competências específicas.
Porém, há algumas que são essenciais na produção de conhecimento e valor como,
por exemplo, inovação, criatividade, resolução de problemas, resiliência e
espírito de equipe.
RH.com.br - Geralmente, o que o talento
espera de uma organização?
Eduardo Carmello - É importante
ressaltar que, na Gestão estratégica de talentos, é preciso tomar muito cuidado
com incentivos tipo "modelo único" que serve para todo mundo. Os
talentos têm necessidades muito específicas. Percebemos significativa mudança
de desejos dos talentos. O pacote das necessidades como salários mais
benefícios é o básico. O desafio mais atual é criar significado para o talento.
Os talentos buscam um trabalho com uma causa social, humanista. Querem
trabalhar de maneira comprometida em seu horário de trabalho, mas não ficar
preso dez ou doze horas por dia em um escritório. Estão mais próximos de serem worklovers
do que workaholics.